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A carência de regulamentação da atividade do NVOCC

Entre todos os modais que constituem a cadeia logística do comércio exterior, o transporte marítimo, indubitavelmente, é o mais utilizado em todo o mundo e é o mais adequado ao transporte de grandes quantidades de mercadorias de baixo e médio valor agregado. Em geral, cabe ao armador, pessoa jurídica ou física, estabelecida e registrada com a finalidade de realizar transportes marítimos, a responsabilidade pelo transporte de cargas de todos os tipos de um porto a outro, respondendo juridicamente por todos as avarias ou efeitos sobre a mesma, a partir do momento que a recebe para embarque.

Recorda-se que o armador não precisa necessariamente ser proprietário do navio que está operando, podendo utilizar navios afretados de terceiros, por viagem, por tempo ou a casco nu, para compor sua frota. Quando se fala em transporte marítimo, comércio exterior e da distribuição física de mercadoria, não se pode deixar de mencionar os agentes externos e os instrumentos que formalizam a atividade de transportar a mercadoria. Entre os vários agentes atuantes nesse segmento da cadeia logística merecem destaque duas importantes figuras jurídicas empresariais: o NVOCC – Non-Vessel Operating Common Carrier (transportador não proprietário de navio), e o transitário de carga (freight forwarder ou forwarding agent).

O “freight forwarder” é conhecido como a pessoa física ou jurídica que providencia o transporte marítimo de carga de terceiros e atua geralmente por conta e ordem do embarcador. Cabe ressaltar, no entanto, que o “freight forwarder” pode também atuar como transportador principal, desde que no seu contrato de prestação de serviços contenha cláusula específica nesse sentido, além da previsão legal para tanto. No Brasil, o “freight forwarder” atua por conta e ordem de terceiro, ou seja, do embarcador, e até como despachante aduaneiro, nos termos do Decreto nº 646/92. A filosofia do NVOCC é a mesma do operador de transporte multimodal (OTM), que realiza o transporte sem ter os veículos necessários para tanto.

A diferença entre os dois é que o OTM compreende diversos modais, emitindo conhecimento de transporte único e responsabilizando-se pela carga, da origem ao destino, enquanto o NVOCC se limita à pernada do modal marítimo. O NVOCC é um transportador marítimo, não operador de navio e não armador, que emite conhecimento de embarque próprio. Trabalha, em geral, atendendo aos embarcadores de pequenos volumes de carga fracionada que, originalmente, não preencheriam a totalidade do espaço de um container. O NVOCC realiza o que o mercado chama de consolidação de carga. Trata-se de um armador sem navio, virtual, que se propõe a realizar transporte marítimo em navios de armadores tradicionais, mas realiza, sob sua responsabilidade, o transporte para os donos da carga, como faz o armador comum.

Nos Estados Unidos, a figura jurídica do NVOCC surgiu através do “Shipping Act nº 4”, em 1984, que reconhecia o tráfego marítimo entre a costa leste norte-americana e a América Latina. Na ocasião, os EUA tiveram que criar facilidades para o pequeno empresário daquele país exportar seus produtos para os novos mercados latino e sul americano. No Brasil, a experiência do primeiro embarque através de NVOCC remonta ao ano de 1986, ocorrido em um navio do extinto LLoyd Brasileiro. Com a dificuldade de desembaraço da carga, naquela ocasião, iniciou-se, na também extinta SUNAMAM, o reconhecimento legal da figura do NVOCC no Brasil.

Todavia, apesar da consolidação do segmento, da sua relevância e, ainda, do crescimento exponencial do comércio exterior no Brasil, inexiste regulamentação satisfatória quanto à atividade do NVOCC, havendo apenas uma Resolução da antiga SUNAMAM, n° 9.068, publicada em março de 1986, que reconhece a sua figura, o que, em última análise, revela-se um contra-senso, principalmente se compararmos o NVOCC aos armadores tradicionais e às empresas brasileiras de navegação. Em ambas as comparações, tais atividades são reguladas e fiscalizadas pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ, que, em vista da relevância da atividade econômica que desenvolvem, exige-lhes o preenchimento de vários requisitos de natureza econômico-financeira, técnica e de regularidade fiscal, sem os quais, não lhes é possível obter a outorga necessária para exercerem suas atividades.

Careceu na Lei nº 10.233, de 5 junho de 2001, que criou a Agência Nacional de Transportes Aquaviários, mencionar a figura do NVOCC. Hoje, a atribuição e atuação da ANTAQ, para regular a atividade do NVOCC, limitam-se ao seu cadastramento e do seu agente desconsolidador, para as operações de importação, inexistindo, na exportação, sequer a necessidade de cadastro do NVOCC. Frise-se que, em momento algum, sugere-se burocratizar, onerar ou dificultar o desenvolvimento da atividade dos NVOCC’s e do setor como um todo. Ao contrário, o que se coloca em debate é a necessidade de haver alguma regulamentação, o que in casu é melhor que nenhuma, principalmente para delimitar obrigações e responsabilidades dos agentes de mercado, posto que marcos regulatórios claros são de extrema importância para o crescimento e segurança jurídica do setor.

A obrigatoriedade do registro de armador para operar como empresa brasileira de navegação

Compreender e atender às exigências legais e normativas contidas nos inúmeros dispositivos da nossa legislação esparsa, por vezes confusos, conflitantes e até mesmo vagos em seu intuito, exige um trabalho hercúleo por parte das empresas e empresários que se submetem, no exercício de suas atividades correlatas, às disposições de nosso Direito Marítimo, composto por leis, regulamentos, normas, convenções e tratados internacionais diversos. O transporte aquaviário de pessoas e mercadorias, cuja competência regulatória hoje se encontra sob a égide da Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ, não foge à regra. Ao contrário.

Entender as normas legais e regulamentos que o regem exige a interpretação de diversos dispositivos legais e normativos emanados de diferentes órgãos de governo e autoridades, inclusive internacionais, que repercutem diretamente na atividade do transporte aquaviário de bens e pessoas. O que se passa a analisar dentro desse contexto é a obrigatoriedade de registro de armador, obtido junto ao Tribunal Marítimo, para operar como empresa brasileira de navegação. Deve-se ressaltar que, para operar como empresa brasileira de navegação, quer na navegação de longo curso, cabotagem e interior ou nos serviços de apoio marítimo e portuário, imperativa é a outorga de autorização pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ.

Os requisitos e demais pressupostos, de natureza econômica-financeira, técnica e jurídica para se obter a outorga de autorização mencionada, estão dispostos e previstos na Resolução Antaq nº 843, de 14 de agosto de 2007. Antes que se empregue uma embarcação na indústria do transporte, se faz necessário que seu operador efetue prévio registro como Armador junto ao Tribunal Marítimo, inclusive quando se tratar de armador-proprietário, na forma contida na Lei nº 7.652, de 03 de fevereiro de 1988.

Diz a referida Lei que armador é “a pessoa física ou jurídica que, em seu nome e sob sua responsabilidade, apresta a embarcação para sua utilização, pondo-a ou não para navegar por sua conta”, na inteligência do seu artigo 16. É certo que a falta de registro de armador sujeita o infrator também ao cancelamento da autorização para operar em qualquer classe de navegação, sem prejuízo da suspensão imediata do tráfego da embarcação em situação irregular ou de todas as embarcações do armador conforme o caso, como disposto no parágrafo primeiro do artigo 28, da Lei nº 7.652/88, uma vez que as embarcações mercantes sujeitas a registro só poderão operar sob a administração de pessoa ou entidade que esteja registrada como armador no Tribunal Marítimo.

Inexiste na Resolução nº 843/2007 – Antaq, entretanto, a definição da figura do armador, apesar de havê-la em outros tantos dispositivos legais, como na Lei nº 9.537/97, que dispõe sobre segurança do tráfego aquaviário em águas sob a jurisdição nacional e na Lei nº 9.432/97, que dispõe sobre a ordenação do transporte aquaviário, havendo, porém, a definição do que se considera “proprietário”, independente da sua condição de armador e de “empresa brasileira de navegação”, que tem como objeto a operação do transporte aquaviário.

O que podemos observar na Resolução nº 843/2007 – Antaq, em seu artigo 3º, onde restam estabelecidas de forma restritiva as condições para que seja outorgada autorização para uma empresa brasileira de navegação operar, é que a empresa deverá atender aos requisitos técnicos, econômicos e jurídicos, estabelecidos também na legislação complementar, inclusive o disposto na Lei nº 7.652/88 quanto a obrigatoriedade do registro de armador. O que se aproveita de tal entendimento é o fato de que, uma vez não atendida à condição de armador (requisito da Lei nº 7.652/88), não poderia a empresa operar embarcações mercantes e, tampouco, obter outorga de autorização da ANTAQ.

O mesmo acontece na via inversa, uma vez que, a empresa brasileira de navegação não sendo mais autorizada a operar e não obtendo a renovação da outorga de autorização no prazo de dois anos, poderá ter seu registro de armador cancelado. É importante, em todos os sentidos, que empresas e empresários mantenham vigilância permanente nos seus procedimentos, para a perfeita e regular manutenção de suas outorgas e demais autorizações e registros necessários para o exercício de suas atividades, evitando, assim, processos de fiscalização ou punitivos por parte das Agências Reguladoras e demais autoridades do setor aquaviário, que, em última análise, podem levar até a cassação da sua autorização para operar como empresa de navegação.

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